Parmênides viveu na antiga cidade grega de Eléia, região próxima hoje à comuna de Ascea, na Itália. Pouco se sabe sobre sua vida, sendo difícil, inclusive, estimar seu ano de nascimento. Uma informação encontrada em Diógenes Laércio dataria seu nascimento próximo a 540 AC, uma descrição feita por Platão, em seu diálogo Parmênides, indicaria que nasceu em 515 AC.
Temos provas de que escreveu apenas um poema, intitulado Da Natureza. Não há informações de sua composição original, mas chegaram a nós dezenove fragmentos. O oitavo é o fragmento com mais versos, seguido do primeiro. Os outros não passam de dez versos e muitos possuem apenas uma frase. Que tipo de pensamento pode-se compreender, a pergunta se coloca, de um texto tão incompleto?
O texto inicia com um PROÊMIO, narrado pelo poeta e com linguagem alegórica, no qual um jovem é conduzido à presença de uma deusa não identificada, que o convida a trilhar um caminho de investigação. Já no primeiro fragmento, essa deusa indica que há algo permanente em meio à diversidade das aparências.
São os fragmentos chamados de CAMINHO DA VERDADE, narrados pela deusa, onde a instrução inicia:
“E agora vou falar; e tu, escuta as minhas palavras e guarda-as bem, pois vou dizer-te dos únicos caminhos de investigação concebíveis. O primeiro (diz) que (o ser) é e que o não-ser não é; este é o caminho da convicção, pois conduz à verdade. O segundo, que não é, é, e que o não-ser é necessário; esta via, digo-te, é imperscrutável; pois não podes conhecer aquilo que não é” (DK 28 B 2.1-7)
A investigação conduzirá à verdade sobre tudo o que se percebe pelos sentidos, o que há de real. Essa parte do poema contém muitas afirmações com implicações epistemológicas e metafísicas, como o trecho acima exemplifica. O final do oitavo fragmento marca o fim da instrução positiva para começar a revelar, em seguida, as opiniões dos mortais.
O CAMINHO DA OPINIÃO seria justamente a parte enganosa do discurso da deusa, aquela da qual o jovem deveria ter conhecimento para que não seja vencido “pelo pensamento de nenhum mortal.” (DK 28 B 8.61) Essa parte do poema é a menor e a que apresenta maior dificuldade de interpretação. São esses fragmentos, entretanto, que apresentam um pouco da cosmologia de Parmênides.
Parmênides pensou o ser como eterno, uno e imutável. No contexto do poema, ‘ser’ é a tradução do grego to eon, que poderia ser entendido como o que é real ou existe. Essa interpretação tradicional, aceita inclusive por Platão e Aristóteles, favorece a visão monista da realidade, na qual o devir indicaria o não-ser. Já que nossa realidade é permeada pela mudança do que é para o que não é, como o desabrochar das flores, tudo o que percebemos seria ilusório, pois os nossos sentidos nos permitem chegar apenas ao transitório e mutável, não a algo real. O não-ser sequer pode ser pensado ou conhecido, pois envolveria uma contradição. O que há de verdadeiro em meio a tudo o que se percebe só seria atingido com o uso do logos (razão em grego).
Muitos pesquisadores ofereceram, nos últimos anos, outras possibilidades de interpretação. Poderíamos, por exemplo, compreender o uso do verbo ‘ser’ no poema como ‘ser o caso’, indicando que há uma verdade a ser descoberta ou conhecida, que seria o sentido veritativo do verbo ser. Essa interpretação, inclusive, está alinhada com a temática essência/aparência presente em muitos textos pré-socráticos. Outra opção seria o sentido predicativo, que nos levaria a considerar um argumento metafísico que indica os elementos constituintes das coisas:
“O que é, nesse sentido, é o que é metafisicamente básico, o ponto de partida em uma explicação. Quando oferecemos uma explicação, dizendo que tal e tal é a natureza fundamental de X, ou que X é realmente Y, nós estamos usando o ‘é’ da explicação fundamental de Parmênides” (CURD, 2006, p. 38, tradução nossa)
Críticas feitas por outros pré-socráticos e comentários posteriores a Platão indicam a relevância desse filósofo para a época. Ainda hoje o poema continua sendo estudado por conter formulações que favoreceram a formulação da lógica e por evidenciar uma investigação ontológica.
Referências bibliográficas:
BORNHEIM, Gerd A. (Org). Os filósofos pré-socráticos. São Paulo: Cultrix, 2005.
CURD, Patricia. Parmenides and after: unity and plurality. In: GILL, Mary Louise; PELLEGRIN, Pierre (Eds.). A Companion to Ancient Philosophy. Oxford: Blackwell Publishing, 2006. p. 34-55 (Blackwell Companions to Philosophy)
DELONG, Jeremy C.. Parmenides of Elea. Internet Encyclopedia of Philosophy. 2016. Disponível em: < https://ift.tt/2A46Eyd>. Acesso em 06 de nov. de 2018.
WILLIAMS, Bernard. The Legacy of Greek Philosophy. In: BURNYEAT, Myles (Ed.). The Sense of the Past: essays in the history of philosophy. Princeton: Princeton University Press, 2006. p. 3-48.
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